#OrgulhoLGBT | Crítica | A morte e a Vida de Marsha P. Johnson

A morte e a Vida de Marsha P. Johnson / Imagem: 3D Animation Production Company por Pixabay
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Pamela Xavier / LED - Uerj Viu

Documentário original da Netflix, A morte e a vida de Marsha P. Johnson, lançado em 2017, reverencia a vida e o legado e escancara o descaso em torno da morte de Marsha P. Johnson, uma mulher transexual e ativista dos direitos da comunidade LGBTQIA+,  morta no dia 6 de julho de 1992, seu corpo foi encontrado no Rio Hudson, em Nova York. O fio condutor do documentário é a reabertura  do caso, depois de mais de 20 anos, pela ativista dos direitos LGBTQIA+ e mulher transexual, Victoria Cruz, que trabalha no Projeto Antiviolência de Nova York, e que era amiga de Marsha. Apesar dos registros oficiais constarem que a causa da morte foi suicídio, durante seus 105 minutos de duração, a obra audiovisual se dispõe a mostrar fatos que evidenciam que essa narrativa não é a mais plausível. 

O filme é dirigido pelo cineasta e jornalista investigativo norte americano David France, vencedor de um Oscar de ‘’melhor documentário'' com Como sobreviver a uma praga em 2013. A identidade criada  pelo longa parte primeiro da investigação de Victoria e sua busca por novos detalhes sobre o crime. Isso acontece através de entrevistas com a família e amigos de Marsha, enquanto alterna entre imagens e vídeos de alguns momentos dela e de outras figuras pioneiras que lutaram pelos direitos LGBTQIA+, seja em protestos ou em momentos de descontração. Uma dessas figuras é Sylvia Rivera, que por sinal, tem grande – e merecido – destaque no documentário, mulher transexual e ativista, que ao lado de Marsha foi uma das principais personagens da rebelião de Stonewall, em 1969.

O evento, que até hoje é considerado um verdadeiro marco para a comunidade, foi protagonizado por mulheres trans, travestis e drag queens, e um dos pontos mais positivos do longa-metragem é que ele faz questão de ressaltar esse fato e dar o reconhecimento a quem merece, mas sempre teve sua importância invisibilizada, até mesmo por pessoas da própria comunidade LGBTQIA+. Isso fica claro durante o icônico discurso feito por Sylvia durante a Parada Gay de New York de 1973, muito emocionada e ao som de vaias do público. Durante a fala, ela se queixou sobre o apagamento e invisibilidade que pessoas da letra ‘’T’’ da sigla estavam sofrendo dentro da comunidade LGBTQIA+ da qual foram precursoras, esse momento é um dos pontos altos do documentário.

Além de lutar pelos direitos da comunidade nas ruas, Sylvia e Marsha fundaram a S.T.A.R (Ação Revolucionária de Travestis de Rua), uma organização criada para promover os direitos da comunidade, e a STAR HOUSE onde abrigavam pessoas LGBTQIA+ que tinham sido expulsas de casa ou estavam em situação de rua. Um dos aspectos mais importantes da produção da Netflix, é a abordagem da questão da invisibilidade e desumanização que mulheres transexuais, travestis e drag queens sofrem da sociedade e da própria comunidade. Ao longo do documentário fica explícito que esses fatores colaboram para que a morte de Marsha tenha sofrido descaso por parte da polícia. 

Ao abordar esse ponto, o filme explora um caso que mostra que violência contra mulheres transexuais e travestis não ficou no passado, o Brasil é um grande exemplo dessa triste realidade, sendo o país que mais mata pessoas transexuais no mundo, somente no ano passado foram 175 assassinatos segundo a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil). Enquanto segue investigando a morte da amiga, Victoria também acompanha o julgamento do caso de Islan Nettles, mulher transexual de 21 anos que foi espancada até a morte por James Dixon, de 25 anos, que, apesar de ter sido condenado, a sentença de 12 anos foi considerada branda pela família e por ativistas. 

Ao reviver as memórias e analisar de forma mais criteriosa os eventos que envolvem a morte desse grande ícone da comunidade LGBTQIA+, o documentário provoca emoção, angústia e tristeza, mas, principalmente, causa uma reflexão sobre os motivos que levam a persistência da invisibilidade de pessoas transsexuais, mesmo após mais de 40 anos do discurso de Sylvia Rivera. Em contraponto à realidade, a obra enaltece o pioneirismo na luta LGBTQIA+ de Marsha e Sylvia, e ressalta que elas existiram, resistiram e devem ser sempre lembradas e celebradas.

O documentário está disponível na Netflix.

Publicado em
Seg, 05/07/2021 - 16:30

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